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sábado, 9 de junho de 2018

O Estado Somos nós


Reza a lenda que no auge do absolutismo europeu, durante o século XVII, foi proferida pelo Monarca Francês Luís XIV a célebre frase “l'etat c'est moi”, em português, “o Estado sou eu”.

Nas democracias acreditamos que o poder emana do povo e das instituições. Todavia, hoje é unânime na nossa sociedade que a vitalidade democrática depende de cada um de nós, cidadãos, que compõem a comunidade política.

Uma das grandes diferenças entre as democracias e os restantes regimes políticos reside no facto da democracia exigir cidadãos ativos, mas também, de termos a plena convicção que a democracia é sempre um projeto inacabado, que a consolidação democrática exige participação cívica e responsabilidade partilhada pela comunidade.

Na verdade, a escolha democrática não é apenas uma escolha de progresso mas, sobretudo, uma escolha de liberdade e para a liberdade. Como tão bem nos ensinou Tocqueville  “ O que em todos os tempos a liberdade prendeu tão fortemente o coração de certos homens são os seus próprios atrativos, o seu próprio encanto, independentemente dos seus benefícios, é o prazer de poder falar, agir, respirar sem constrangimento, sob o único governo de Deus e das leis. Quem procurar na liberdade outra coisa para além dela própria foi feito para servir. “

Se a opção pela democracia não é, apenas, uma opção de progresso, mas sobretudo de liberdade, não é de se ignorar que a sociedade, capitalista ou pós-capitalista, no qual vivemos,  pressupõe que o progresso e bem – estar material seja, também, um dos fins do Estado moderno. A democracia  requer  a participação cívica, não só na tomada de decisões políticas, mas também, a participação na democracia económica, contribuindo, como o nosso trabalho, para a produtividade económica e exigindo a sua justa repartição,  visando o bem-estar comun.

Nas nossas sociedades atuais tornou-se rotineiro exigir do Estado (que somos nós) melhores condições de desenvolvimento e crescimento pessoal e coletivo. Os próprios políticos, representantes do povo, nas campanhas eleitorais passaram a prometer dar benefícios e levar o desenvolvimento às pessoas. Sintetizando, tanto no cidadão comum como os políticos, generalizou-se a ideia que o Estado é uma figura mítica, distante do cidadão e responsável pelo desenvolvimento económico, social, cultural e até pessoal.

Ao analisarmos a crescente assunção do papel do Estado nas sociedades atuais, nos apercebemos, facilmente, que, no passado, o crescimento do papel do Estado nas sociedades teve uma relação direta com o crescimento da produtividade económica do Estado.
Na verdade, se nas democracias acreditamos que o poder do Estado emana do povo, acreditamos, também, que a capacidade de ação do Estado advém da capacidade do seu povo e das condições que ele, o povo, com o seu trabalho, possibilita ao Estado para intervir, elevando ou diminuindo o seu grau de intervenção consoante o grau do crescimento económico.

Se no passado as políticas sociais do Estado, na sua grande maioria, eram financiados pelas receitas fiscais, atualmente, apesar do aumento crescente dos recursos do Estado, através da arrecadação dos impostos, a grande maioria das políticas sociais são feitas com recurso aos empréstimos externos que as gerações vindouras terão de pagar.

O aumento do endividamento externo dos Estados tem consequências económicas completamente imprevisíveis como demonstrou a crise das dívidas soberanas na Europa. A reposta a crise gerada pelo endividamento não é dogmática, isto é, a receita depende sempre do contexto económico de cada Estado em particular.

o crescimento da divida pública não deve impossibilitar os Estados de fazerem os investimentos que se enquadram num projecto de crescimento económico e desenvolvimento, pois, o endividamento dos Estados, ao longo da história, foi sempre sofrendo alterações: Por exemplo, países como o Reino Unido ou a França tiveram ao longo da sua história dívidas públicas que rondaram os 200% do PIB. 

O desafio que se coloca atualmente aos Estados modernos ultrapassa questões ideológicas e políticas e interpela os cidadãos a demanda por políticas públicas sustentáveis e aos decisores públicos a uma maior adequação das políticas públicas à realidade económica dos Estados. 
Em relação ao cidadão é um dos papeis centrais do Estado proporcionar  a sua  qualificação, capacitando-o para ser o dono do seu destino, promovendo, ao mesmo tempo, políticas públicas que garantam condições condignas de crescimento económico e  desenvolvimento. 


sábado, 1 de julho de 2017

Regionalização e o défice de representatividade: Porquê regionalizar?

O processo de regionalização é, antes de mais, uma reacção contra o centralismo no país, vindo da ilha que sempre lutou contra o centralismo, pela democratização do desenvolvimento e por um maior equilíbrio de poder entre às ilhas. 
Na verdade, São Vicente e a sua elite representam, ainda, a réstia da intelectualidade presente nas ilhas e que não estão centralizadas na capital do país, que detém a quase totalidade das universidades e do conhecimento científico gerado.

Porquê regionalizar? A pergunta parece simples mas traduz nela a complexidade do processo e a necessidade que as ilhas sentiram de se afirmarem no plano cultural, político, económico e social. Se é verdade que no país a homogeneidade identitária nunca foi posta em causa, não é de se menosprezar as diferenças culturais presentes nas ilhas, pois, a diversidade não pode ser encarada com sentido pejorativo, ela é uma riqueza imensurável do povo das ilhas, que ao serem bem aproveitados, poderão se consubstanciar numa mais-valia para o todo nacional.
A centralização do país nos últimos anos é, de facto, uma evidência inegável. Esta centralização decorre não só do enorme desequilíbrio na economia nacional, mas também, das dinâmicas próprias do desenvolvimento, de entre as quais, podemos destacar a terciarização da economia nacional, que deu azo ao fenómeno sobejamente conhecido como - o êxodo rural - que na Brava, foi agudizado pela, já antiga, veia migratória dos Bravenses.
O economista Adam Smith, há muitos anos atrás, demonstrou que as economias dependem muito da capacidade do seu povo de empreender e produzir, mas também, dependem do equilíbrio útil entre produtores e consumidores. Hoje sabemos que a economia de qualquer país depende não só da produtividade dos seus trabalhadores, assim como, da produtividade do seu stock de capital (conceito de difícil explicação, pois ao contrário do stock de trabalhadores, não é mensurável em unidades físicas). Porém, a variável, consumo, continua a ser determinante para aferirmos o grau de crescimento de economias.
O Estado ocupa um papel central na definição das políticas públicas, por isso, como árbitro e moderador do sistema, compete-lhe criar as condições para que, na atuação dos diversos agentes, estes tenham condições de criar riqueza e gerar bem-estar às populações, ou seja, gerar crescimento económico e desenvolvimento.
O êxodo rural é um processo complexo, dinâmico e transversal que atingiu quase todos os países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento. Em Cabo Verde ele acentuou-se no pós- crise do sub-prime de 2008 e durante a recessão económica que se deu numa parte significativa do país, enquanto a capital continuava a crescer de forma robusta.
A diferença do fenómeno do êxodo rural em Cabo Verde com o resto do mundo é que ele foi considerado um processo, demasiadamente normal, como fazendo parte da própria idiossincrasia do povo, o que não permitiu que houvesse um estudo aprofundado das causas e consequências da
perda da população, em alguma ilhas e da Brava em particular, que estou em crer, foi das ilhas que mais população perdeu nos últimos anos. Assim, a perda da população não incitou nos governantes a necessidade de se tomarem medidas, plasmados em programas políticos, que visassem a criação de condições específicas para a manutenção da população autóctone.
Nos países desenvolvidos é visível a preocupação dos governos com a desertificação das zonas rurais o que, por si só, representa uma preocupação com a perda de identidades culturais. Na Brava, várias zonas foram completamente despovoadas, sem que houvesse uma preocupação com este fenómeno.
Além das questões sociais, a económica é, com efeito, a que mais preocupação levanta. A economia de Cabo Verde assenta numa desigualdade enorme na produtividade económica entre as ilhas, sendo muito dependente do turismo de sol e praia, as ilhas que mais se desenvolveram, nos últimos anos, foram as que se ancoraram nesta tipologia de turismo como fonte de desenvolvimento. Desta forma, não é de se espantar que Boavista e Sal tenham tido um exponencial crescimento na última década, enquanto, outras ilhas, como a nossa, fizeram o percurso inverso, sendo que, de acordo com os últimos dados conhecidos do INE contribuímos entre 0.8-1% para o PIB nacional, o que é manifestamente pouco.
A desigualdade económica é preocupante, porém, antes de procurarmos saber o porquê desta desigualdade, convém, perceber que um governo centralizado na capital do país não consegue responder às necessidades imediatas dos mais recônditos sítios do país devido à insularidade, ou seja,
pelo facto de sermos ilhas. Por isso, a procura de uma solução que consiga aproximar o governo das ilhas sempre esteve na cogitação dos partidos, desde os primórdios da independência.
Porém, a distância do governo central para com as ilhas foi sendo suprimida pelas Câmaras Municipais que, dotadas de meios, através da assinatura dos contratos-programa com o Governo central, iam garantindo a articulação entre as políticas de índole local e governamental.
Na verdade, só um poder local, com vontade e capacidade, pode responder aos desafios das ilhas nos actuais moldes em que se encontram definidos os órgãos de soberania nacional. A Câmara Municipal é, por inerência, o poder mais próximo das pessoas, tendo, de acordo com o Estatuto dos Municípios de Cabo Verde, sob a sua alçada, todos os assuntos que diretamente influenciam a vida dos munícipes. Porém, não podemos deixar de notar que, por falta de recursos financeiros e sobretudo humanos, não lhes é possível dar cobro a todas as necessidades nas ilhas. Como é sabido uma das consequências da crise foi o congelamento das admissões na administração pública o que não permitiu que as Autarquias renovassem os seus quadros e correspondessem, de forma adequada, aos desafios que lhes coloca o tempo presente.
O municipalismo em Cabo Verde foi bom até ao momento em que os municípios-ilha, como é o nosso caso e o de São Vicente, não tiveram mecanismos suficientemente diferenciadores com os restantes municípios. Uma ilha não é só um município, ela corresponde a um território, político, identitário, cultural e económico muito importante que deve ter nas leis basilares da república mecanismos que permitam que esta parte do território seja reconhecida como tal e tenha condições de preservação das
identidades culturais, mas também, de desenvolvimento e crescimento económico. Por outro lado as ilhas têm problemas específicos como a contínua necessidade de melhoria nos sistemas de proteção civil, das condições de prestação de cuidados de saúde, de melhoria dos sistemas de transportes, pelo que se espera que a regionalização vá criar estas condições
Em termos políticos, a necessidade da regionalização extrapola o tempo presente e as necessidades económicas sentidas pelas ilhas para o desencadeamento do processo. Apesar da regionalização atualmente discutida ser a regionalização administrativa, há uma questão política importante e que carece de reflexão: o problema político reside no facto de que, no atual sistema politico nacional é muito fácil que um deputado da Assembleia Nacional bem-intencionado vote favoravelmente a um projeto de lei ou uma lei que prejudique a sua ilha natal ou concelho de onde vem. Tal acontece porque, quando eleito, o deputado representa a nação ou mais, propriamente, o Estado e ao querer representar todos corre o risco de não representar ninguém. A reforma do parlamento, há muito tempo prometido, deve repensar o modelo de representação dos nossos cidadãos e adotar, o quanto antes, um sistema de representação direta, através da criação de círculos uninominais, que permitirão a responsabilização direta dos representantes da soberania pelos representados.
O processo de regionalização decorre do crescimento económico heterógeno, isto é, bastante desigual em Cabo Verde, da desigualdade nas dinâmicas económico e social, com principal enfoque na perda da população, da incapacidade, ou impossibilidade, das autoridades locais, principalmente as autarquias locais, de responderem aos desafios de
crescimento económico e desenvolvimento e ainda devido ao défice de representatividade das ilhas na agenda política nacional.
Estes são desafios do nosso tempo que colocam a regionalização sobre uma forte expectativa: Será que a regionalização irá resolver todos os problemas de representação política, de construção de programas direcionados para o bem-estar das ilhas e na edificação de uma visão ampla de desenvolvimento para das ilhas? É o que tentaremos esmiuçar no próximo artigo.

Jonathan Vieira

sábado, 16 de julho de 2016

A importância da eleição autárquica para a mudança de paradigma no desenvolvimento da ilha Brava.

A eleição autárquica que irá decorrer no próximo mês de Setembro terá uma importância vital para o desenvolvimento da ilha. A autarquia, por ser o poder, por definição, mais próximo das pessoas, tem uma importância vital na vida dos cidadãos. Independentemente do partido ou do projeto político que vier a ganhar a eleição, há uma eminente necessidade de mudança de paradigma na gestão autárquica na ilha.

A Brava é a ilha mais pequena do país e não obstante os seus valiosos recursos: um povo trabalhador, uma ligação muito forte à diáspora, uma enorme tradição marítima, uma agricultura pujante, um clima ameno e diferente das restantes ilhas, uma ilha com enormes potencialidades de desenvolvimento, a realidade é que tem sido das ilhas que menos se tem desenvolvido.

Infelizmente, nos últimos anos, é notório a inexistência de um verdadeiro projeto de desenvolvimento local: A centralização do desenvolvimento no nosso pequeno mercado interno que, por si só, não consegue dar azo as legítimas expectativas de crescimento económico, conduziu a um apaziguamento do crescimento económico sem precedentes na história do país e numa diminuição acentuada da população local.

 Por isso, não é de se espantar que ao mesmo tempo que assistimos a investimentos públicos muito grandes, vemos, de igual forma, uma diminuição da população local. Esta constatação nos deve fazer refletir se estamos, realmente, a investir na melhoria das condições de vida dos bravenses ou se, simplesmente, estamos a gastar dinheiro público sem resultados.

O que se está a passar na Brava é gravíssimo: a população tem diminuído de ano para ano, a juventude da ilha não consegue ali fixar residência, pois, as expectativas de desenvolvimento pessoal, de trabalho, parecem ter terminado, sem que ninguém, demonstre ou aparenta estar preocupado com o problema.

Assim, assistimos à uma emigração como nunca de antes visto, um desemprego que bate recorde no contexto nacional, à uma economia frágil e de subsistência, que não cria emprego, que não contribui para a geração de riqueza e que se sustenta na prestação de pequenos serviços. Neste quadro, a ilha se tem definhado, sem que os reais problemas tenham uma resposta séria e ponderada, tendo por base um projeto de futuro.

O problema é mesmo político. A autarquia não pode ser um construtor de obras, uma entidade afastada da vida das pessoas, não pode se afastar dos reais problemas da ilha e definir a construção de obras que são tudo, menos aquilo que as pessoas mais precisam.

Em pleno século XXI nenhuma economia, por mais pequena que ela seja, pode sobreviver com um défice continuo na balança comercial. Por mais que nos esforcemos e que se construa obras públicas, sem se resolver o problema económico, a ilha não se irá desenvolver. O desenvolvimento económico não acontece por milagre, não é, fazendo nada, que o crescimento irá aparecer, mas é, sobretudo, apostando no desenvolvimento dos fatores de competitividade que ela poderá ocorrer. 


A Câmara Municipal tem de ser uma entidade com competências técnicas, não só, para executar obras e projetos, mas para pensar a ilha com uma visão abrangente e que não se concentre, apenas, em apagar os fogos ou ir resolvendo os problemas. É preciso ter uma visão de longo prazo, que compreenda os problemas e que conceba políticas públicas adequadas para resolver os problemas momentâneos, mas também,  para preparar a ilha para o futuro. 

sábado, 11 de junho de 2016

As próximas eleições: o que está em jogo?

Estamos em pleno ano pré-eleitoral e as próximas eleições serão decisivas para o futuro do no nosso país e da ilha. O país encontra-se na maior “encruzilhada” da sua história, pois, é chegado a hora dos investimentos realizados no capital humano, na educação, na infraestruturação do país, no processo de transformação, começarem a ter impacto real no desenvolvimento do arquipélago e substituírem o endividamento externo pela criação de riqueza. Ao mesmo tempo o país é hoje confrontado com uma série de problemas aos quais urge uma resposta credível. A nível local o desemprego abunda, a falta de uma estratégia coerente de desenvolvimento atrasou substancialmente o crescimento económico em comparação com as outras ilhas. 
As eleições são sempre um momento importantes da vida democrática: é a altura dos cidadãos escolherem o rumo que querem dar a sua pátria. Todavia, em Cabo Verde, o debate programático e político, tem ficado num patamar inferior enquanto pequenos factos pessoais dos políticos têm marcado as campanhas eleitorais. Face a este histórico e perante a conjuntura é importante que os cidadãos se esforcem para exigirem dos políticos programas eleitorais credíveis e que consigam dar resposta as demandas da população.
Cabo Verde tem feito um percurso fantástico: somos um país relativamente jovem e que tem conseguido ao longo dos anos ter um desenvolvimento consolidado ao longo dos anos, sendo esse processo marcado por uma estratégia de transformação, tendo por base uma visão que o país possa se tornar num centro internacional de prestação de serviços. Essa visão, quase unanime na sociedade, requer nos próximos  anos um aumento da produtividade nacional para que o país possa competir num mundo tão exigente.
Apesar dos muitos ganhos que o país conseguiu nas últimas décadas encontramo-nos hoje numa encruzilhada: mesmo tendo feito um percurso notável, os problemas sociais ainda estão aí para serem resolvidos, num cenário internacional pouco favorável ao apoio exterior. Se por um lado o nosso maior aliado internacional e o nosso maior parceiro económico, a União Europeia, se encontra em crise, a graduação do país como país de rendimento médio trouxe importantes desafios no tocante a busca de mecanismos de financiamento.
Os desafios são enormes, num país onde o desemprego estrutural abala os sonhos de uma juventude lutadora e sonhadora.
Perante este cenário, as próximas eleições serão decisivas para o futuro do país e requerem estratégias que consigam alavancar o crescimento económico de forma consistente. Os desafios que o país tem pela frente só poderão ser consolidados se cada ilha conseguir ter uma economia local que consiga ser uma mais-valia para o país.
Jonathan Vieira.



As Manifestações em Cabo Verde e as Suas Consequências no Panorama Político

As manifestações que, recentemente, ocorreram em cabo Verde não deixaram ninguém indiferente e marcarão uma nova era na política Cabo-verdiana, passando a sociedade civil a desempenhar o seu papel de fiscalização da ação política nacional. Por outro lado, um dos desafios para a consolidação da nossa democracia é termos uma sociedade civil vibrante e participativa nas decisões políticas. A aprovação do Estatuto dos titulares dos cargos políticos já contribuiu e irá contribuir, decisivamente, para que o país avance uns degraus neste longo trajeto de consolidação democrática.
Apesar destas movimentações em todo Cabo Verde, na Brava, tudo ao ritmo da morna. Todavia, somos a ilha onde as manifestações faziam mais sentido e era não só pelos Estatuto dos titulares dos cargos políticos, mas pela situação económica e social gritante pelo qual a ilha enfrenta de uns tempos para cá. Porém, nem sempre foi assim, quem não se lembra da manifestação por causa do motor velho na furna? Sim, quando queremos conseguimos nos unir e resolver os nossos problemas.
O povo foi à rua e demonstrou o seu descontentamento pela conjuntura onde os privilegiados “deputados” querem, não atualizar, mas aumentar o seu salário. Não podemos permitir que um país com uma elevada desigualdade social, dado aos parcos rendimentos que a camada menos favorecida detém, aumente o fosse entre a sociedade e os seus representantes.
A aprovação do Estatuto dos titulares dos cargos políticos demonstrou o quanto os deputados da nação estão afastados dos seus representados, não só, em termos do rendimento disponível, mas também, da própria perceção da realidade. Na presente conjuntura, ganhar o montante que os atuais deputados ganham, é o que o país pode oferecer para quem quer representar o seu povo e trabalhar a bem da nação.
A única justificação para a subida do salário na casa parlamentar se assemelha com aquela atitude: " o outro ganha mais do que eu", neste caso, alguns gestores de empresas públicas que ganham mais do que os deputados. Todavia, isto não justifica que perante a situação económica e social do país se aumente os salários dos titulares dos cargos políticos. É preciso haver equilíbrio entre o nível de vida dos cidadãos, a riqueza gerada pelo país e os salários dos titulares dos cargos políticos.
Se o país pode aumentar o salário dos deputados, porque não usar este mesmo montante para criar mais postos de trabalho e empregar mais jovens? Sim, porque pode-se, de facto, dignificar mais os cargos políticos sem ter que, necessariamente, aumentar os salários.
Fazendo uma leitura política, era pouco provável que o atual Presidente da República promulgasse o diploma, pois, este é o seu primeiro mandato e ele irá a eleições dentro de um ano. De igual forma, o diploma alargaria um fosso enorme entre a classe política e a sociedade. Apesar do diploma ter sido aprovado na casa parlamentar, quase por unanimidade, há muita coisa em jogo e era muito arriscado para o futuro político do presidente se ele se afastasse do povo que o elegeu.
Os grandes vencedores deste jogo Político foram: a atual líder do PAICV, Dr.ª Janira Hopffer Almada, que cedo se demarcou da aprovação do referido diploma, aproveitando o momento político para fazer a sua consagração como presidente do PAICV e o Presidente da República, Dr. Jorge Carlos Fonseca, que demonstrou elevação e sentido de Estado ao chumbar politicamente o diploma.

Jonathan Vieira.  


domingo, 5 de junho de 2016

Brava e os Caminhos para o futuro: Olhar para o passado, resolver os problemas do presente e perspetivar o futuro

A Brava é herdeira de uma história gloriosa: No passado, fomos a capital administrativa da colónia, geramos ideias, tivemos atividade industrial e temos uma herança invejável na formação dos recursos humanos, da qual a formação dos marítimos é um legado indelével da nossa história. Todavia, o nosso maior feito terá sido o nosso contributo à emancipação da identidade Cabo-verdiana, através da cultura.  
Hoje é necessário olhar para o passado, resolver os problemas do presente e perspetivar o futuro: Que ilha queremos ter no futuro e o que podemos fazer, hoje, para construirmos este futuro perante os desafios atuais?

A realidade da Brava é preocupante. A ilha vive no período da mais longa recessão que a nossa pequena economia já conheceu e os dados assim o demonstram: Somos a economia que menos contribui para a geração de riqueza nacional, entre 0.8 -1% do PIB nacional, temos a mais alta taxa de desemprego do país, cerca de 18, 5%, e a nossa população tem diminuído de forma considerável. 

Estes são dados que nos devem preocupar, pois, houve, no passado, muitas gerações que lutaram para edificarem uma ilha que se vem desvanecendo ano-após-ano.
 Assim, assistimos, nos últimos anos, à um declínio contínuo, sem que haja uma estratégia programática de desenvolvimento para a ilha.  

 Se analisarmos o contributo da economia das ilhas, para o PIB nacional, ao longo dos anos, nos apercebemos, facilmente, que há uma enorme heterogeneidade na economia Cabo-verdiana: O centro do país tem estado a se afirmar como sendo o grande contribuidor para o produto interno nacional e algumas ilhas, como a Brava, têm perdido espaço. A economia baseada nos serviços não tem permitido que a ilha desenvolva os seus sectores estratégicos, que possibilitem gerar riqueza, criar emprego e aumentar o rendimento para as famílias. O crescimento débil da ilha não tem acompanhado o ritmo acelerado de desenvolvimento do país, na última década, e as mudanças que vão ocorrendo, sobretudo, no que toca ao desenvolvimento dos fatores de competitividade.

Os avanços que se deu na educação, as qualificações humanas e a investigação produzida continuam afastados da ilha. O fraco aproveitamento, pelas empresas, da qualificação dos recursos humanos continua a ser um problema estrutural na nossa economia. Este facto advém, em grande medida, da circunstância das empresas não terem introduzido as inovações decorrentes dos avanços tecnológicos, o que impossibilitou à ilha de tirar partido da maior qualificação dos recursos humanos para ganhar eficiência e competitividade. 

A conjuntura da ilha é marcada por uma crise gravíssima, que se traduz numa diminuição acentuada da população, num desemprego crescente e numa baixa produtividade da economia. Por isso, é cada vez mais visível a necessidade de haver uma agenda económica para a Brava: uma agenda que garanta o desenvolvimento sustentável da ilha, que se concentre no crescimento económico, no desenvolvimento de sectores estratégicos, na diversificação e alargamento da base produtiva, mas também, que integre a emigração no desenvolvimento local. 

Só tem futuro quem consegue tirar vantagem do passado, e o passado da Brava constitui um ativo, que não podemos desperdiçar, para construirmos o futuro. A nossa história e cultura constituem valores centrais para o nosso desenvolvimento que, infelizmente, temos desperdiçado. O desenvolvimento passa, necessariamente, pela existência de uma agenda económica que possibilite a criação de emprego, assente na introdução das novas tecnologias de informação e comunicação no meio empresarial, mas também, que permite, igualmente, o reforço dos sectores estratégicos, com mais inovação, eficiência e produtividade, para que possamos tirar vantagens dos avanços dos últimos anos, nomeadamente, a melhoria do sector dos transportes.

A ilha Brava só tem futuro se conseguir estar na linha da frente das transformações que Cabo Verde precisa, para enfrentarmos estes tempos desafiantes, marcados por uma grande incerteza. 
Jonathan Vieira.
https://naalvorada.blogspot.pt/
  

domingo, 29 de maio de 2016

Sociedade civil e partidos políticos em democracia: A realidade de Cabo Verde

"Somos seres eminentemente políticos". Esta frase dita há milhares de anos atrás é ainda valida para a nossa sociedade atual. Na verdade, a política e a procura do bem comum, encontram-se no cerne da atividade humana, porém, poderemos nos questionar: Será que a democracia se resume aos partidos políticos?
Nas nossas vidas quotidianas quando um cidadão começa a falar sobre um tema de interesse geral, não é muito difícil, que a terceira ou quarta pergunta seja esta, dí qui partido bó é? (qual é o teu partido?). Isto é o mais comum na maioria das conversas que todos nós temos uns com os outros, porque muitas vezes, reduzimos a democracia aos partidos políticos e à sua atividade.
Para lidar com um determinado problema local, a nossa primeira reação é, muitas vezes, nu bai tchoma autoridade, es tem qui resolveno nós problema! (Vamos chamar a autoridade, eles têm que resolver o nosso problema!).
De facto, isto é o reflexo da nossa visão da democracia, centramos tudo nos partidos políticos e no Estado, e não damos espaço para participação da sociedade civil, que nas democracias modernas, tem um papel importantíssimo. Em todo o mundo, os movimentos sociais alastram-se, mudando a realidade e desempenhando um papel fundamental de fiscalização e de ação, influenciando, desta forma, o exercício do poder.
Desta reflexão não podemos omitir o papel, também ele, importante, que os partidos políticos, representam na sociedade, por conseguirem agregar as mais diversas visões da sociedade em torno daquilo que consideram ser do interesse da população e que através do exercício do poder, pretenderão implementar.
Se os partidos políticos são importantes, o exercício da democracia não se resume à sua atividade. Infelizmente, ainda, se organizarmos uma manifestação ou qualquer ato público, que seja do interesse geral, é muito fácil sermos conotados com partidos políticos ou, até mesmo, não participamos pelo receio de nos ligaram à atividade político-partidária.
A liberdade de associação e de expressão, entre outras, são direitos e garantias constitucionais que não servem se ficarem apenas no papel, mas sim se forem vivenciadas, porque a lei fundamental do país assim o consagra. Por isso, quando qualquer cidadão começa a falar, em vez de fazermos a pergunta de que partido é ele, é altura de perguntarmo-nos porque é que ele fala de um determinado assunto, e qual é o contributo para a melhoria da sociedade da qual fala.
Há uma sociedade para além dos partidos políticos e quanto mais a sociedade civil for dinâmica, participativa e eloquente mais sai a ganhar Cabo Verde, um país que em termos democráticos tem feito progressos notáveis, sendo visível não só pelo facto de termos uma democracia estável e exemplar no contexto africano, mas também pelo nível do debate politico, que de uma forma branda tem aumentado de qualidade, e que se traduzem numa melhoria significativa das condições de vida das pessoas e nos ganhos que o país tem tido ao longo dos anos.
É necessária uma sociedade civil que participa no debate político e nos partidos políticos, mas que não se restringe a ela, porque, para além dos partidos políticos, há o interesse das pessoas e há, sobretudo, o bem comum, o alicerce da nossa organização social.

Jonathan Vieira